Nem
sempre. E ignorar um comportamento não é uma parte importante da
educação dos cães.
Muitos
dizem que quem usa o método do reforço positivo para educar os cães
só ignora o mau comportamento. Mas isso é um mal entendido, típico
de quem confunde o treino dos cães com punição. Se
alguém acha que um adestrador que usa reforço positivo não faz
nada para diminuir um comportamento, então ignorar é a única
opção. Mas não é bem assim.
Ignorar
um comportamento indesejável não é algo de
extrema importância na educação pelo reforço positivo. O que
fazemos, na verdade, é evitar
que um comportamento indesejado aconteça e, se acontecer, o
interrompemos desde o início. Ou
você acha que só ignoramos quando um cão pula em uma pessoa idosa
ou em uma criança pequena? Se um cão repete um comportamento, ele
tende a ficar mais forte, então deixar que o cão pule sem
interromper a ação não adianta nada. Digamos
que você acorda domingo e seu cão pula em você. Na segunda você
acorda e ele também pula em você. Na terça e na quarta também. O
que você acha que vai acontecer na quinta-feira?
Ignorar
um comportamento faz parte de um plano de treino, mas é feito de
forma controlada e em conjunto com um comportamento incompatível (um
cão não pode pular e sentar ao mesmo tempo, por exemplo).
O
lado ruim de ignorar um comportamento é que isso é muito difícil
de se fazer. Mas lembre-se que você não vai apenas ignorar um
comportamento, mas vai trabalhar para ensinar algo que você ache
melhor para que ele deixe de fazer aquilo que não é legal.
Por
quê só ignorar não funciona?
1.
Não
dar atenção a um comportamento achando que ele vai simplesmente
desaparecer é acreditar que a atenção é a única recompensa para
aquele comportamento.
Pular é um exemplo clássico. Se a gente só ignorar um cão que
pula, dando as costas pra ele, ele vai continuar pulando, mas nas
nossas costas. O problema é que os cães gostam de pular, então o
pular em si já é uma recompensa para eles, você dando ou não
atenção. Ignorar
um cão assim, não vai te levar a lugar nenhum.
2.
Se
o comportamento continua por causa de atenção, não conseguimos
aguentar por muito tempo ignorando o cão.
Aqui
vamos usar o latido como exemplo. Seu cão late assim que você senta
para comer. Geralmente você dá um pedacinho de comida pra ele. Um
dia você decide que já chega. Você já cansou dessa latição toda
e decide que não vai mais dar nada pra ele enquanto estiver comendo.
Será que você consegue? Mesmo seu cão estando confuso e fazer
aquela carinha de esfomeado, olhando para você? Ele só quer um
pedacinho de queijo e, fala a verdade, você gostava de dar o queijo
pra ele. Se você ignora a latição por 45 minutos e desiste e dá
logo o queijo “porque não aguenta mais”, você perdeu. Estes 45
minutos serão seus inimigos, afinal, você ensinou seu cão a ser
super persistente. Mesmo
que você ignore por mais tempo na próxima vez e não dê o queijo…
o que dizer de outras pessoas que vivem com você, os amigos e
parentes que vêm te visitar? Eles vão fazer isso, sempre? E outra:
isso é justo para o cão? Ele está apenas fazendo um comportamento
que sempre foi recompensado antes e agora, de repente, não funciona
mais.
3.
Achamos
que estamos ignorando, mas há uma “recompensa ilícita”.
Esta é uma ramificação do número 1. O comportamento pode não ser
auto-recompensador, mas há um a recompensa disponível, que não
controlamos. Digamos, estou ensinando o “fica”. Ele sai da
posição e vem na minha direção e eu o ignoro. Então, ele vai
cheirar a grama. Nada produtivo ter ignorado o cão: ele foi
recompensado por ter ido cheirar a grama!
4.
Ignorar
não ensina qual é o comportamento que desejamos. Quando
mudamos um comportamento, precisamos ensinar um novo para ficar no
lugar daquele outro. Se deixamos por conta do cão, vamos acabar com
um comportamento ainda pior que o original. Então, ao invés de
simplesmente ignorar o que não gostamos, é mais eficaz e mais
humano ensinar um comportamento diferente e fazer o cão praticá-lo.
Quando queremos eliminar um comportamento que encaramos como um
problema, interferimos em algo que funcionava para o cão. Para
sermos justos, ensinamos ao cão o novo comportamento e nos
certificamos que este seja mais recompensador que o anterior.
As
dificuldades quando precisamos ignorar
O
número 4 diz que, algumas vezes, podemos ignorar um comportamento
quando recompensamos outro. É aí que ignorar o comportamento ajuda
no processo de educação. Mas ignorar é complicado.
O
que é ignorar?
Mesmo quando precisamos ignorar um comportamento como parte da
educação, pode ser difícil
pra caramba. Quando estamos lidando com comportamentos que são
feitos em parte por causa de atenção, qualquer tipo de atenção
será encarada como recompensa. Os cães nos leem muito bem. Se ele
está pulando em você e te arranha, você dá um grito. Isso não é
ignorar e pode ser encarado como recompensa. Se o filhote está
incomodando seu cão mais velho enquanto você dá atenção a ele,
você afasta o filhote. Isto também não é ignorar e pode ser
encarado como recompensa e pior: ele pode achar que você está
chamando-o para brincar. Até olhar para o cão é encarado como
recompensa. E acredite: é super difícil para de olhar para o cão.
Se for preciso, abra um livro mas não olhe para ele!
A
dica
é: trabalhe comportamentos alternativos (incompatíveis) e
recompense-os muito! Ignorar o mau comportamento faz parte do plano,
mas apenas se você ensinar o que é certo também.
Não
recompensar não é ignorar
Quando
ensinamos um novo comportamento e não recompensamos aquilo que não
atinge o esperado, não estamos ignorando. Na maioria dos casos,
nossa atenção está totalmente voltada para o cão. Sim, é
verdade, nossa atenção pode ser uma forma de recompensa, mas seu
poder é ofuscado pela recompensa melhor que usamos quando ele faz
aquilo que queremos. Atenção + comida (ou brincadeira) é uma
recompensa muito melhor que só a atenção. Por isso que uso comida
e brincadeira quando educo.
Quando
ignorar é bom
Alguns
cães chegam em nossas casas tão assustados que ignorá-los é
benéfico. Isto vai contra nossos instintos, de tentar acolher. Isso
é muito comum de acontecer quando adotamos um cão adulto, um
filhote de fábrica de filhotes, um cão que sofreu abusos: queremos
lhe dar amor. Mas essa nem sempre é a melhor solução. Ignorar pode
inclusive dar mais confiança ao cão.
Usando
o exemplo do Pistache. Ele chegou para mim já adulto, veio de um
lugar onde conhecia todo mundo, e chega em outro lugar onde não
conhece nada e nem ninguém. Normal ficar com medo. O que eu fiz? O
ignorei. Por dois dias. Foi extremamente difícil, mas isso deu a ele
uma confiança absurda na gente, foi se tornando mais seguro do
ambiente em que vivia e se soltou. Hoje, é um cão confiante e sabe
que pode contar comigo em qualquer situação.
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